sexta-feira, 13 de maio de 2011

Fabio Rosso entrevista psiquiatras

 O perfil do assassino que comete uma chacina

Fabio Rosso
            A chacina na praça da igreja da Candelária que matou oito jovens no Rio de Janeiro em 1993, a dos quatro funcionários do Ministério do Trabalho mortos em 2004 enquanto trabalham em Minas Gerais e a recente tragédia de Realengo, em que um jovem matou estudantes inocentes em uma escola do Rio de Janeiro são exemplos de quão violento e inconsequente um ser humano pode ser.
            Para entender a mente destes assassinos e as situações sociais que estas pessoas geralmente se encontram,  entrevistei psiquiatras para compreender um pouco mais sobre o comportamento destas pessoas. 
Fabio Rosso - O que pode levar uma pessoa a cometer uma chacina?
Cláudio Joaquim Paiva Wagner (médico psiquiatra) : Provavelmente, ou na maioria dos casos, essas pessoas são portadoras de uma Psicose. Psicose é a perda da noção da realidade onde o pensamento do indivíduo e o seu comportamento é influenciado por delíros (que são falsas crenças) e alucinações visuais ou auditivas (que são alterações das percepções onde as pessoas podem ser comandadas por vozes que só elas escutam ou por visões). Em outros casos são pessoas vítimas de bullying que passam a se vingar dos indivíduos que os fizeram passar por humilhações.
Albino Júlio Sciesleski (médico psiquiatra): Crise aguda de distúrbio mental.
Heliara Cachoeira (médica psiquiatra): Chamamos de  periculosidade de uma pessoa  o conjunto ou circunstâncias que indicam a possibilidade dela praticar um crime, ou seja, indica probabilidades e não certeza absoluta. Estudando a curva vital da pessoa, seu ajuste às circunstâncias e fatos da vida, são indicadores de periculosidade a falta de aplicação escolar, interrupção de aprendizado, inconstância no trabalho, integração com grupos sem atividades construtivas, existencia de criminalidade precoce, número elevado de incidentes jurídicos e policiais, distúrbios precoces de conduta e início precoce de doença mental. O que leva a cometer o ato é então, fatores genéticos, experiências traumáticas precoces e geralmente um desencadeante atual.
Fabio Rosso - Uma pessoa sem histórico de problemas psicológicos/psiquiátricos pode cometer uma chacina? Em que situações?
Wagner: É muito pouco provável, porque estes sintomas têm um início insidioso e que vai se agravando com o passar do tempo.
Sciesleski: Sim, pode.
Cachoeira: Uma pessoa que pratica um crime, já tem uma história de vida que contribui para  chegar a este desfecho. Mas não necessariamente, ela tenha sido diagnosticada como doente.
ComArte - Como identificar um psicopata que comete este tipo de crime em massa?
Wagner: Geralmente eles demonstram alguns sinais significativos como alterações de comportamento que não eram vistas anteriormente, esquisitices, isolacionismo, verbalizações agressivas e conduta agressiva.
Sciesleski: Está com os pensamentos perturbadores contidos na mente, devido a auto crítica ainda presentes. No entanto qualquer caráter reativo (morte,financeiro) pode desencadear a crise .

Cachoeira:     A pessoa que tem um perfil extremamente agressivo, pode se esconder atrás de um isolamento afetivo e social, ou pode também ser sedutor, trapaceiro, com ausência de sentimentos de culpa e usando o outro para benefício próprio; Apresenta  baixa tolerância à frustração e quando isso ocorre, rompe a agressividade que estava contida. Mas como na vida não há um determinante específico, este perfil dá indícios de que a pessoa tem uma mente perturbada, não necessariamente que ela cometerá crimes. Aliás, chacinas são  os menos frequentes dos assassinatos.

 
Fabio Rosso -  Há alguma forma de familiares e/ou amigos preverem que determinada pessoa irá cometer uma chacina?
Wagner: Se os familiares e os professores notarem alterações de comportamento caracterizadas por um aumento do comportamento agressivo tanto verbal quanto físico é um indicativo de risco.
Sciesleski: É difícil, mas o distúrbio de comportamento na família e no trabalho social, se observados pelos mesmos, há possibilidade para algum tipo de esclarecimento à ajuda.
Cachoeira: Frente a dados da história pregressa, do estudo de fatores genéticos e familiares, podemos predizer a probabilidade da pessoa ser agressiva, mais capaz de causar dano a outros, mas não tem como afirmar com certeza pois são muitos os mecanismos que a pessoa usa para frear seus impulsos ou não.
Fabio Rosso -  Quais aspectos podem levar o assassino a determinar/escolher as vítimas?
Wagner: Isso é muito variável, vai depender da história de vida de cada um, da presença de psicose ou de bullying.
Sciesleski: É muito difícil especificar, mas o comportamento da pessoa , sendo inadequado, deve ser observado.
Cachoeira: Sabe-se que traumas repetidos na infância contribuem para alterar a forma de ver a sociedade e também provocam mudança de comprotamento em crianças e adolescentes, por exemplo o bullying, tão falado hoje em dia, torna as crianças  mais retraídas, ansiosas e socialmente isoladas, entre outros sintomas, pois se sentem excluídas, não amadas e rechaçadas. Pessoas vítimas de abuso na infância apresentam geralmente um mundo mental esvaziado de representações e constantemente se tornam dominadas por afetos de conteúdo negativos. São pessoas desconfiadas quanto às motivações daqueles que os cercam, o que reforça  as estratégias  do seu pensamento que distorce o desenvolvimento normal da função de refletir sobre a vida. O que move  o assassino a escolher determinadas  vítimas são os motivos inconscientes acrescidos da ocasião.
Fabio Rosso -  Quais doenças podem deixar a pessoa com tendências para cometer um crime como este (chacina)?
Wagner: Os crimes estão mais ligados a patologias de personalidade como no Transtorno de Personalidade Anti-Social, mas a presença de psicose é considerado um fator de risco em alguns casos, mas consiste em uma exceção e não a regra.
Sciesleski: Distúrbio mental deve ser bem observado e avaliado. A cabeça é tudo. Então têm distúrbios afetivos, esquizofrenias , epilepsias...
Cachoeira: Estudos mais aprofundados mostram que qualquer  abuso crônico modifica a química cerebral, principalmente em regiões fundamentais para o processamento das emoções. São, as crianças, os chamados "maus meninos", os  que provocam, ameaçam ou intimidam os outros. Frequentemente iniciam lutas corporais, usaram arma capaz de causar sério dano físico aos outros, foram cruéis fisicamente com pessoas e animais, roubaram com confronto com a vítima etc,
Também indica o grau de periculosidade de alguém a forma como o crime foi praticado, por exemplo, com agravantes legais, crimes brutais, sem motivos psicológicos claros, crimes com multiplos golpes, com frieza de sentimentos , crimes praticados contra pessoas indefesas. A doença mental por si só nao é indicativo de periculosidade, inclusive são raros doentes mentais que em surto provocariam um massacre como o do Rio de Janeiro, dados que se observa de periculosidade em pessoas doentes, é o humor explosivo, falta de crítica sobre seus atos, agitação psicomotora, surtos psicóticos graves, alucinações, delírios, falta de remorso.
Fabio Rosso - Qual sua opinião sobre este tipo de comportamento/crime?

Wagner: Ele é considerado um problema grave de saúde pública. Infelizmente a saúde mental tem sido pouco considerada nos sistemas públicos de saúde. Os investimento são muito menores que em outros setores e o que acontece pode ser uma consequência desta falta de valorização, pois nós temos poucos profissionais de saúde mental nos serviços públicos. Por exemplo, Passo Fundo não dispoõe de um CAPS I, ou seja, um Centro de Atenção Psicossocial destinado ao atendimento de crianças e adolescentes com problemas mentais. 
Sciesleski: Acidente de causa desconhecida deve ser sempre avaliado desde o problema social, psicológico e psiquiátrico, pois mentes sãs dificilmente levam à chacina.
Cachoeira: Acredito que só cuidando de nossas crianças é que o mal pode ser minimizado.  O  sentido que  os adultos atribuem aos gestos da criança, mesmo  um gesto banal como tocar o outro, dependerá a forma como o bebê se sentirá como autor do toque. Ora terno, ora violento, ora vazio, tudo decidido, inicialmente, pelo olhar desse outro com quem interage, geralmente sua mãe e seu pai. O olhar do pai e da mãe é  o espelho do bebê. Ele se vê neles. Uns pais que fortalecem os laços de amor, mostrará a seu filho a capacidade de amar. Reforço em laços de ódio, fortalecerá o ódio. Depois, os tropeços da vida serão mesclados com este primeiro olhar. Com isso cresce a importância da qualidade de nossos encontros. Os bons e os maus.  Um alento quanto ao futuro: Se a criança sentiu-se gostada e gratificada, poderá fazer mais coisas amorosas  do que tirar o tapete dos outros ou fazer o mal. Do contrário, mal amada, mal olhada, mal querida, frustrada mais do que o suportável (ou o saudável), fará o mal, que é também fruto da impossibilidade de se colocar no lugar do outro, aquilo que hoje nomeamos de empatia, capacidade essencial para uma boa relação humana.


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