domingo, 31 de julho de 2011

Resenha

Relações robóticas de um mundo não tão futuro
Fabio Freitas de Rosso¹
            Um relacionamento maquínico. Seres feitos de lata com características humanas. Tecnologia, mundo digital, ciberespaço, real, virtual, um constante processo de territorialização, desterritorialização e reterritorialização. Um mundo não tão futuro. Uma sociedade não tão fictícia. Esses e outros aspectos já previstos pelos seres humanos há muito tempo atrás, hoje já dão indícios a uma possível sociedade que integra intensamente inteligência humana e artificial. É esse também o contexto que norteia o livro Eu Robô,  uma coletânea de nove contos escritos por Isaac Asimov, em 1950. Traduzido em 2004 pela Ediouro Publicações a obra apresenta um universo de possibilidades desta sociedade que investe a cada dia em novas tecnologias, tendo como personagens principais estes seres denominados de robôs.
            Não é incomum encontrarmos hoje em dia crianças se comunicando via MSN, por exemplo. A informação territorializada, que logo após sofre o processo de desterritorialização e depois é reterritorializada, transformando o comportamento tanto no espaço físico, quanto no espaço virtual, em um ciclo constante, é exemplo de que as relações sociais já estão bem diferentes de como eram antigamente.
            A relação de Robbie, o robô do primeiro conto de Isaac, com a menina Glória, se assemelha a esse comportamento que os jovens adotam na rede. As crianças não sentem mais tanto a necessidade do contato físico uma com as outras. Esse hábito é substituído pelas relações virtuais, do contato com máquinas que produzem conteúdo e que suprem suas necessidades.
            Da mesma forma, se reconfigura a comunicação. As redes sociais, como o orkut, por exemplo, que cria comunidades específicas para que os usuários possam interagir mutuamente a partir de seus interesses comuns, construindo significados a partir disso, carregam consigo uma das características principais do jornalismo online, oriunda dessa comunicação digital realizada no ciberespaço, que é a interatividade.
            Ao mesmo passo, Robbie atendia as necessidades da Glória. Assim como prevê o sistema de consumo, que diz que os homens são dotados de necessidades e buscam por objetos fontes que o satisfaçam. Mas como nunca estão satisfeitos, o ciclo se repete, como um mito, ou se assim podemos dizer, como os robôs, que são programados para atender as necessidades dos humanos.
            Tal conceito está previsto na Segunda Lei da Robótica que diz que um robô deve obedecer às ordens dadas por seres humanos exceto se tais ordens entrarem em conflito com a Primeira lei. “Eu posso vencê-lo todo dia. – Ela cantou estridente”, comemorava Glória. Será que se outra criança estivesse brincando com ela, agiria da mesma forma que o robô? Acredito que não, o que frustraria os anseios da menina de ser a vencedora em todas as bricadeiras.
            A mãe de Glória, porém, não considerava saudável esta relação, e tratava Robbie com ideias de descartabilidade, atribuindo a ele necessidades passageiras, oriundas do sistema de consumo, que consequentemente refletem nas relações. “Pode ir agora, Robbie. Ela não precisa mais de você”, afirmava a senhora.
            Os robôs também são parecidos com os humanos em termos de serem forjados em série, ou seja, são semelhantes assim como os homens que desenvolvem determinados hábitos pois precisam pertencer, serem aceitos nos grupos. Além disso, os robôs funcionam como a lei da cibercultura denominada Conectividade Generalizada que põe em contato direto homens e homens, homens e máquinas, mas também máquinas e máquinas que passam a trocar informações de forma autônoma e independente.
            Também podemos comparar os robôs, a objetos já existentes que  realizam funções vitais, como os óculos, begalas, entre outros, que suprem as necessidades humanas. Como defende Canevacci (2007), é uma espécie de coisificação do homem e humanização da coisa. São humanos utilizando da tecnologia para sobreviver e a tecnologia adquirindo características humanas para estarem adaptadas à sociedade.
            Com as vantagens desta relação, Glória não queria animal de estimação, não desejava amigos novos, não estava interessada em conhecer novos lugares. A menina só pensava em Robbie, que pode ser comparada com o ser maquínico da sociedade contemporânea que, conforme Batista (2011), é o sujeito forjado em série, marcado por uma ordem capitalística mundial, mas que ao mesmo tempo que segue tendências do mercado, carrega consigo processos de singularização. Robbie era único, atendia necessidades, substituia afetos, evitava problemas, superava expectativas.
            Sem dúvidas, vivemos em um mundo que caminha para uma nova tendência, marcada pelo consumo, pela tecnologia, pelo individualismo, pelo excesso de representeção. Mas aonde esta trajetória irá chegar, só o futuro responderá.    
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¹ Acadêmico de Jornalismo da Faculdade de Artes e Comunicação da Universidade de Passo Fundo (FAC/UPF). Estagiário da RBSTV Erechim. E-mail: farosso@terra.com.br. Resenha elaborada  na disciplina de Estudos Contemporâneos da Comunicação e da Cultura, ministrada pela professora Bibiana de Paula Friderichs.
REFERÊNCIAS
ASIMOV, Isaac. Eu, robô. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.
BATISTA, Maria Cardinale. Emoção e subjetividade na paixão-pesquisa em comunicação. Desafios e perspectivas metodológicas. 2011.
MASSIMO, Canevacci. A metrópole comunicacional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo, Faculdade de Artes e Comunicação. DVD. Palestra realizada durante o VIII Intercom Sul, 2007.

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